• 06 abr 2020

    Que somente os capitalistas e o governo arquem com os custos da pandemia e da crise econômica

5 de abril de 2020

A Medida Provisória (MP) 936, mentirosamente chamada de “Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda”, protege apenas os capitalistas. Dá carta branca ao patronato de reduzir a jornada e suspender o trabalho, reduzindo os salários. A desfaçatez da farsa é tão visível, que pretende parecer bondosa, ao deixar de fora quem ganha um salário mínimo, R$ 1.045,00. Acima desse valor, até três salários mínimos (R$ 3.135,00), os salários poderão ser reduzidos entre 5% a 10%, no caso da redução de 25% da jornada de trabalho. No caso da redução da jornada em 50%, a perda ficará entre 10% e 20%. Se a redução da jornada for de 70%, a diminuição salarial ficará entre 15% e 30%. A imensa maioria dos trabalhadores recebe de um a três salários mínimos. Segundo os cálculos do Dieese, o salário mínimo de março deveria ser de R$ 4.483,20. Como se observa, mesmo os trabalhadores que estejam na faixa de quatro salários mínimos não recebem um salário mínimo que cubra as necessidades vitais.

A concentração de renda é bárbara. Os 10% mais ricos ficam com 43,1% da massa de rendimento. Os 10% mais pobres, com 0,8%. O rendimento médio de 1% mais ricos, é 38 vezes o rendimento de 5% mais pobres. Ainda segundo o IBGE, em 2018, 10,4 milhões sobrevivem com R$ 51,00 mensais; e os 30% mais pobres, que correspondem a 64 milhões de trabalhadores, garantem sua existência com uma renda média de R$ 269,00.  A imensa maioria dos assalariados recebe de 1 a 3 salários mínimos. Esse quadro, que se agravou com a recessão de 2015-2016, e com o baixo crescimento dos anos seguintes, explica o avanço da pobreza, miséria, fome, doenças, violência, criminalidade, desintegração familiar, etc. A pandemia ressalta a miséria estrutural e a incapacidade da burguesia de realizar reformas em favor da maioria oprimida. Ao contrário, as medidas de proteção ao capital financeiro, no período da crise aberta em 2008, e as contrarreformas posteriores à recessão de 2015-2016, impulsionaram a concentração de riqueza, num polo, e a expansão da pobreza e miséria, no outro.

A pandemia se manifesta no Brasil no momento em que os capitalistas implantam a reforma trabalhista de Temer e a previdenciária de Bolsonaro. No momento em que a taxa de desemprego é alta e tendente a crescer. O que amplia a gigantesca informalidade e o subemprego. Antes de se abater sobre o País, o governo Bolsonaro se via diante do estancamento econômico e da elevação do desemprego. A economia brasileira era arrastada pela diminuição do crescimento mundial. A generalização da pandemia acelerou o processo de atravancamento das forças produtivas mundiais. Os países de economia atrasada, envoltos pela pobreza e miséria generalizadas, estão obrigados a arcar com o maior peso das consequências econômicas e sociais da pandemia. As potências lançaram planos trilhonários de apoio ao capital financeiro e aos monopólios. Mesmo assim, as previsões são as de que o desemprego se elevará a um alto patamar. Os Estados Unidos retomam o seu lugar de epicentro da crise mundial. Em toda a parte, a burguesia descarrega a crise sobre os assalariados, desempregados e subempregados. Nos países onde imperam a miséria e a fome, como os da América Latina, com destaque para o Brasil, as medidas de proteção ao capital agravarão a crise econômica, e alavancarão a barbárie social.

O “orçamento de guerra”, aprovado na Câmara de Deputados, que permitirá ao governo elevar às alturas a dívida pública, não vem em função da garantia dos empregos, saúde pública e subsistência de milhões de desempregados e subempregados. Pela primeira vez, o Banco Central fica autorizado a comprar títulos dos capitalistas para evitar perdas e quebras. A previsão é a de que haverá uma elevação do déficit em R$ 419,2 bilhões. Uma pequena parcela será destinada aos informais e subempregados, no mísero valor de R$ 600,00. Outra, auxiliará no combate à pandemia. Essa diretriz mostra que, sob a direção do Estado burguês, não é possível combater a crise sanitária, como meio de proteção à maioria explorada.  A MP 936 é um ataque violento aos empregos e salários. Os R$ 600,00 destinados a uma parcela dos 38 milhões de trabalhadores informais servem de máscara à incapacidade da burguesia e seu governo, de proteger mesmo que emergencialmente a vida das massas.

As multinacionais, tendo à frente as montadoras, anunciaram que, ao término das férias coletivas, farão um “ajuste” na produção, e que contam para isso com os sindicatos, para negociar um acordo. A Mercedes-Benz deu a entender que não terá como manter os postos de trabalho. De conjunto, pleiteiam antecipadamente uma flexibilização da jornada e salário, mais dura ainda que a aplicada no momento do isolamento social. O cumprimento da diretriz do Ministério da Saúde e dos governadores, de concretizar a orientação da Organização Mundial da Saúde (OMS), em boa medida, se deve, de um lado, às férias coletivas; de outro, à determinação dos governadores e prefeitos de fecharem as atividades consideradas não essenciais (comércio, serviços). Nos estados industrializados, observa-se a importância da dispensa dos operários, o que afeta a base produtiva do país. Combinado com a desativação do comércio e serviços, se constitui em um quadro de quebra das pequenas e médias empresas. O que repercute sobre a economia nacional, atingindo os estados menos industrializados, que tiveram de fechar o comércio e suspender os serviços, e portanto num salto do desemprego.

Os assalariados fabris, do comércio e de serviços sentiram, desde o início do isolamento, que corriam o perigo, não só da contaminação, mas também da perda do emprego. A MP, que permite ao patronato reduzir a jornada ou suspender temporariamente o trabalhador, comprova esse temor, que poderá ser mais grave do que se supunha. O governo e o patronato oferecem, na melhor das hipóteses, a redução dos salários, que pode chegar até 30%, para quem ganha até 3 salários mínimos. Esse é o preço, na melhor das hipóteses, como dissemos, que os capitalistas e o governo cobram dos explorados para garantir uma limitada proteção contra a pandemia. O preço mais alto recairá sobre milhões, que perderão os empregos. Os milhões, por sua vez, que sobrevivem da informalidade pagarão com o aumento da miséria. Essa escala de valor expõe a falência do capitalismo, e a necessidade da revolução proletária, que expropriará a burguesia, instalará um governo operário e camponês e transformará a propriedade privada dos meios de produção em propriedade socialista.

Trata-se do amadurecimento das condições objetivas para a revolução, que reflete a incapacidade da burguesia de garantir a existência de milhões de trabalhadores. As condições objetivas, por si só, não levam à revolução proletária. É necessária a direção revolucionária, que se concentra no partido do proletariado. A crise de direção mundial se manifesta profundamente na crise de direção nacional. Eis por que, numa situação tão grave de bancarrota econômica, os explorados ficam à mercê de medidas que aumentam o desemprego e reduzem os ganhos. As direções sindicais e dos movimentos se alinharam imediatamente com a política burguesa do isolamento. Não foram capazes de diferenciar as premissas científicas do isolamento das premissas político-ideológicas desenvolvidas pela burguesia. A constatação, no momento, de que o método do isolamento é o único meio disponível a ser aplicado deve ser acompanhada de soluções econômicas e sociais que protejam de fato a população. Estabelecer o isolamento, sem garantir os empregos e salários, é a forma burguesa de descarregar a crise sobre a maioria oprimida.

As centrais sindicais cancelaram o “Dia Nacional de Luta”, de 18 de março, que poderia ter armado o movimento com um programa de emergência próprio da classe operária, e oposto ao do governo. As condições iniciais da pandemia, e as primeiras ações do governo, exigiam a convocação de assembleias em todo o país, e constituir os comitês de defesa dos explorados. Se o isolamento era a única forma de proteger as massas, ainda que limitadamente, as direções que controlam as organizações operárias, camponesas, populares e estudantis tinham a obrigação de explicar, à classe operária e demais explorados, que não se tratava apenas da crise sanitária, mas também da crise econômica, que levaria o governo a proteger os interesses da burguesia, em detrimento das necessidades da maioria oprimida. Tinham de mostrar que a aceleração da crise econômica resultaria em rápida elevação das demissões. Não se tratava, portanto, apenas de defender a população da pandemia, mas também da desintegração econômica. As duas crises interligadas desabariam, principalmente, sobre os assalariados, desempregados e subempregados. As centrais, no entanto, desmontaram o movimento, e se colocaram sob a bandeira burguesa de “união nacional”. Reivindicaram sua participação nas decisões de Estado. O que foi desconhecido pelo governo e Congresso Nacional. Mais recentemente, os burocratas se aproximaram do governador Doria. Tudo indica, com a mediação de Lula. A política de colaboração de classes da burocracia levou as centrais a se alinharem em torno às divergências de Bolsonaro com os governadores, liderados por Doria, sobre a forma do isolamento. A subordinação das centrais, sindicatos e movimentos às respostas da burguesia contribuiu, decisivamente, para a classe operária permanecer dissolvida, e incapaz de se levantar contra as medidas de redução da jornada e suspensão do trabalho com redução salarial, bem como diante das demissões massivas.

As correntes de esquerda centristas e reformistas se mostraram incapazes de compreender as contradições originadas das duas crises – sanitária e econômica – e, via de regra, se arrastaram por trás da política burguesa de isolamento social, adaptando-se à burocracia sindical. A CSP-Conlutas, dirigida pelo PSTU, aprovou o cancelamento do “Dia Nacional de Luta”, e fez um chamado à desmobilização. Em seguida, passou à campanha por uma “greve geral”, para garantir o isolamento dos operários. Isso nas condições em que a burguesia, com apoio das centrais, conduzia as diretrizes sanitárias, e mostrava que duras medidas contra os trabalhadores seriam tomadas. Assim, os sindicatos foram esvaziados de sua base social, e sequer podiam realizar assembleias para colocar nas mãos da classe operária a defesa de um plano de emergência próprio.  A farsa da “greve geral” concluiu em férias coletivas nas grandes fábricas. É nas condições de completa desorganização sindical que o patronato e o governo impõem a MP 936, o “orçamento de guerra”, etc. E a divergência entre Bolsonaro e Doria mascara a concordância com as violentas ações da burguesia contra as condições de trabalho e existência dos explorados.

Passada a pandemia, emergirá com maior contundência a tragédia do desemprego e subemprego. As migalhas distribuídas pelo governo e Congresso Nacional têm fôlego curto, e mal amenizam a amplitude da miséria. As multinacionais retomarão a diretriz de flexibilização capitalista do trabalho, com demissões e cortes salariais. A reforma trabalhista vigorará com maior impacto. E um contingente muito maior de explorados sentirá o golpe da reforma da Previdência. A burocracia sindical manterá a linha de “união nacional”. O PT e aliados esperam se potenciar eleitoralmente como oposição. Partidos da burguesia, como o PSDB, que liderou o golpe de Estado em 2016, se apoiarão na divergência dos governadores com Bolsonaro, para constituir uma frente ampla, que sirva de alternativa à possível desintegração do governo fascistizante.

A vanguarda com consciência de classe tem de redobrar o esforço na luta pela independência política do proletariado e demais explorados, das variantes da política burguesa, que empurraram as massas ao matadouro. A bandeira de que a burguesia pague integralmente pela crise sanitária e econômica materializa a resposta proletária, e impulsiona a independência política diante da burguesia e seu Estado. A campanha do Partido Operário Revolucionário é de: Nenhum apoio ao plano de emergência de Bolsonaro, Congresso Nacional e governadores. Por um plano de emergência da classe operária e demais explorados. E que as centrais e sindicatos rompam com a política de conciliação de classes, que se coloquem imediatamente por organizar a luta, em defesa dos empregos e salários. Abaixo a Medida Provisória 936. Preparar, desde já, a luta contra o desemprego, unindo empregados, subempregados, sob a defesa do plano proletário de emergência.

É obrigatório que a vanguarda com consciência de classe enfrente a crise de direção revolucionária, vinculando o plano de emergência da classe operária ao programa de expropriação do grande capital, nacionalização dos bancos, não pagamento da dívida pública e controle operário da produção. Sob a bandeira do governo operário e camponês, a vanguarda se destacará no combate ao governo militarista e ditatorial de Bolsonaro.