• 26 set 2020

    Separar o trigo do joio

Separar o trigo do joio

Editorial, Massas 620, 27 de setembro de 2020

A situação está calamitosa para a classe operária e a maioria explorada. O desemprego em alta, a miséria e a fome avançando. A pandemia continua matando, principalmente, os mais pobres. Falta pouco para se chegar a 150 mil mortos. A política burguesa do isolamento social fracassou quanto à pandemia, mas ajudou os capitalistas a demitirem, reduzirem salários e eliminarem direitos.

Mesmo assim, a pesquisa do Ibope, contratada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), concluiu que a popularidade de Bolsonaro cresceu, comparada à de dezembro de 2019. A parcela da população que considera o seu governo ótimo e bom é de 40%. Caiu de 38% para 29%, a avaliação da parcela que considerava ruim ou péssima. Há que considerar que a maioria, 60%, tem algum motivo para reprovar a administração de Bolsonaro. Os 40%, nas condições de crise sanitária e econômica, descarregadas sobre a maioria oprimida, no entanto, não deixam de ser surpreendentes. São enigmas desconcertantes da política burguesa.

Os analistas explicaram o fenômeno com o auxílio emergencial de R$ 600,00, destinados aos trabalhadores informais, subempregados e desempregados. O que mais poderia ser? A influência desse valor assistencial – muito acima do Bolsa-Família – sobre 65,3 milhões de pobres e miseráveis, tem um peso considerável na avaliação de qualquer governo.

Diante da pergunta sobre o combate ao desemprego, 37% consideraram positivo. Mesmo que, na pesquisa passada, 41% achavam que Bolsonaro estava no caminho certo, a resposta positiva de 37%, na atual situação, é surpreendente. O caráter geral da pergunta não permite saber com precisão quem é quem, neste universo de 37%, que cometeria um desatino lógico tão flagrante. Com certeza, deve misturar milhões de pequenos e médios patrões, que se valeram da MP 936, e milhões de trabalhadores que não perderam o emprego, e se acham ideologicamente presos ao bolsonarismo (a influência das igrejas evangélicas ainda é grande). Mas, a queda de 41% para 37% não deixa de ser significativa – 63% não consideram positivo o combate do governo ao desemprego.

Esse sentimento que impera entre a população é o dado mais significativo da pesquisa. O grande problema da situação se encontra no desemprego, subemprego e informalidade. A maior parte da força de trabalho vem sendo golpeada pela ausência de postos de trabalho, que diminuem em vez de aumentarem.

É reconhecido, até mesmo por representantes da burguesia, que as dificuldades não começaram com a pandemia. Desde a queda abrupta do crescimento econômico, em 2014, a taxa de desemprego foi às alturas, impulsionando o subemprego e informalidade. Os capitalistas aproveitaram o caos, provocado pela pandemia e pela política burguesa do isolamento social, para demitir, rebaixar os salários e liquidar direitos. Acelerou-se a implantação da contrarreforma trabalhista do governo Temer.

Esse processo fluiu livremente, graças à adaptação da burocracia sindical às pressões da burguesia, principalmente, do grande capital. Adaptação que reflete, em última instância, a política reformista do PT e de aliados. A colaboração das centrais e sindicatos, sem exceção, com a aplicação do MP 936 confundiu os explorados, e permitiu que Bolsonaro e o Congresso Nacional comparecessem como salvadores, e não como carrascos dos assalariados. Ao propagandearem que o auxílio emergencial de R$ 600,00 foi uma conquista dos trabalhadores, os reformistas, burocratas e esquerdistas pequeno-burgueses ocultaram a sua real origem, motivo e função de abafar o impacto das demissões e do crescimento em grande escalada do desemprego.

Neste exato momento, as centrais fazem a campanha de assinatura, sob a bandeira “600 pelo Brasil! Bota pra votar já, Maia.” Os eleitoreiros saem a campo, galopando nessa grosseira demagogia pequeno-burguesa. Isso quando foram cúmplices, diretos ou indiretos, do acordo de demissão de cinco mil operários da Volkswagen. Todos se esquivaram e viraram as costas para a onda crescente das demissões em massa. Não fizeram nada para apoiar a greve dos Correios, que acabou no isolamento, e asfixiada. O mesmo se passa com a limitada greve da Embraer.

Não existe mais isolamento social. E as centrais e maioria dos sindicatos ainda continuam se apoiando na política burguesa do isolamento social, para mascarar o brutal resultado da colaboração de classes, que acabou e acaba servindo ao governo Bolsonaro.

Como tarefa política do momento, cabe à vanguarda consciente, que luta pela independência política do proletariado e demais explorados, separar o trigo do joio.  A defesa das reivindicações mais sentidas, empunhadas por meio da luta de classes, e sob a estratégia do governo operário e camponês, é a condição para se conquistar a independência de classe.