• 07 maio 2021

    Polícia executa 24 pessoas na favela do Jacarezinho (RJ)

Polícia executa 24 pessoas na favela do Jacarezinho (RJ)

Governador, Bolsonaro e general Mourão apoiam a chacina

Prefeito Eduardo Paes lamenta em palavras

Estampada em sangue a barbárie capitalista

7 de maio de 2021

Os fuzilamentos nas favelas do Rio de Janeiro são constantes. Mas, desta vez, o abatimento de 24 moradores, denunciados pela polícia como traficantes, excedeu a marca histórica das chacinas. A invasão da favela do Jacarezinho, no dia 6 de maio, se caracterizou por uma operação de guerra. As Polícias Civil e Militar lançaram uma ofensiva, com o objetivo claro e explícito de fazer uma limpeza, sob a justificativa de defender as crianças e os jovens que estariam sendo arregimentados pelo narcotráfico.

Em janeiro de 1998, a polícia matou 23 pessoas na Vila Operária, em Duque de Caxias.  É bom lembrar esse banho de sangue, uma vez que organismos de direitos humanos e a imprensa denunciaram a existência de grupos de extermínio, formados no interior das forças de repressão, no estado do Rio de Janeiro. Ficou patente a relação entre policiais e narcotráfico. As violentas milícias nasceram dessa relação. Não foi possível ocultar a existência de uma poderosa fração criminosa no interior da estrutura estatal. Está presente no Executivo, no Legislativo, no Judiciário e na Polícia. Não poderia ser de outra maneira, uma vez que o narcotráfico e o crime organizado em geral expressam uma importante movimentação econômico-financeira. A política de Estado, como superestrutura, inevitavelmente, se aproxima e se vincula a esse mundo do crime. O narcotráfico e as contravenções são reconhecidos como financiadores de eleições.

É impossível desvincular a criminalidade da política burguesa. Relação essa encarnada pelo braço armado do Estado. Isso explica por que nenhum plano de redução da letalidade policial e do controle do crime organizado tem tido êxito. Mas, não só por isso. A crise estrutural do capitalismo, que se reflete mais completamente na sua fase última, que é o imperialismo – fase dos monopólios e do capital financeiro parasitário –, potencia as formas econômicas deletérias, como o narcotráfico, tráfico de armas, escravização, etc.  Os mais de US$ 500 bilhões, movimentados nesse submundo da economia mundial, se processam em meio às massas empobrecidas e miseráveis.

A América Latina, mergulhada no atraso, e marcada profundamente pelo desemprego, subemprego e fome, há muito se tornou um celeiro do narcotráfico, e uma zona de contrabando de armas, que vêm dos Estados Unidos. Isso explica, em grande medida, o fortalecimento constante da polícia, astronômicos gastos parasitários com os aparatos repressivos, e importação de técnicas e materiais bélicos de uso contra as manifestações de trabalhadores. Agigantou-se o Estado policial, com características comuns em todo o continente.

O Brasil se destaca como o mais poderoso deles, com a polícia altamente treinada e organicamente vinculada à política, ao ponto de ter constituído o que denominou a “Bancada da Bala” no Congresso Nacional.  O presidente da República foi eleito com a participação ativa e ampla da Polícia e das Forças Armadas. Até agora, continua aberto o processo judicial, que apura os vínculos seus filhos com as milícias do Rio de Janeiro. O apoio do governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro, que ocupou o lugar do governador cassado por corrupção, Wilson Witzel, à chacina reflete a posição do presidente da República. Recentemente, no conflito dos governadores em torno à pandemia, Bolsonaro e seus generais orientaram o parlamentar do PSL, Major Vitor Hugo, a levar adiante o Projeto de Lei que subordina as polícias estaduais ao presidente da República. Essa investida expôs a tendência ao recrudescimento do Estado policial.

O Rio de Janeiro, por concentrar as contradições entre riqueza e miséria, desenvolvimento e atraso do País, expõe o fracasso da burguesia em cercear o crime organizado, impulsionado pelo Estado policial. A tentativa de integrar a polícia com o que se denomina de “comunidade” se desmanchou com as UPPs, do governador Sérgio Cabral, hoje preso por corrupção. O desaparecimento do pedreiro Amarildo de Souza, sequestrado por policiais na Rocinha, jogou uma pá de cal na hipocrisia da integração entre favela e polícia. A violência policial se reergueu, com o furor da matança no Jacarezinho de jovens negros e pobres. E, com ela, as vozes “dos pacificadores”, pedindo que se cumpram as orientações da Corte Interamericana dos Direitos Humanos. Exortam a criação de um “plano de redução da letalidade policial no Rio de Janeiro”. Pedem que a Defensoria Pública atue em favor dos direitos humanos.

Nem bem se começa a esquecer de um morticínio, ocorre outro em algum estado do país. E as mesmas vozes repetem a mesma ladainha. Procuram ocultar as raízes da violência policial, que se encontram na propriedade privada dos meios de produção e no Estado capitalista.  Mais à esquerda, vozes reivindicam a desmilitarização da polícia e a sua democratização, como a via de compatibilizar o braço armado do Estado burguês com a sociedade. A tendência do capitalismo em decomposição é a de potenciar ainda mais o Estado policial. Não há como a maioria oprimida enfrentar essa situação, se não for com o seu programa de poder, que pressupõe a destruição do Estado burguês e com ele todo o aparato militar e policial. Somente com a estratégia da revolução proletária, a vanguarda com consciência de classe tem como orientar os explorados em meio à barbárie.

O fato é que não há regras de direitos humanos e medidas de democratização da polícia que sirvam para erradicar as raízes da violência. Ao contrário, é preciso expor aos olhos dos explorados que as chacinas e as mortes diárias causadas pela ação policial – somente no primeiro semestre de 2020, foram assassinados pela polícia 3.181 pessoas no Brasil; no Rio de janeiro, de janeiro a março de 2021, já eram 453 – resultam da decomposição econômica e social do capitalismo e, portanto, do avanço da barbárie. Deve-se se ter em mente que a mortandade não é exceção do estado do Rio de Janeiro. De janeiro a maio de 2020, São Paulo bateu o recorde, nas duas últimas décadas, com 442 pessoas assassinadas pela polícia.

A facilidade e a impunidade como os policiais matam nas favelas e bairros empobrecidos indicam, não apenas o recrudescimento da militarização do polícia, mas também a ausência de respostas do movimento operário e popular. Os bairros miseráveis estão sob o controle da política burguesa, que se realiza por meio de associações, ONGs, igrejas e partidos.  Para romper a camisa de força desses organismos, que servem para conter a revolta instintiva dos oprimidos, é necessário que a classe operária, organizada em seus sindicatos, se coloque à frente das reivindicações dos explorados. O desemprego, subemprego e o salário mínimo, que não cobre as necessidades da família trabalhadora, estão na base de todas as tragédias vividas nos bairros, favelas e cortiços. Não é desconhecido que a juventude é arrastada para o narcotráfico e todo tipo de criminalidade em razão da pobreza e miséria.

A frase ignóbil do vice-presidente da República, general Mourão, de que “eram todos bandidos”, dá a dimensão precisa do que pensam os representantes da burguesia sobre as condições vividas pela imensa maioria da população. Não reconhecem um só fio de cabelo de que esses “bandidos” são jovens cercados pela pobreza, miséria, promiscuidade e completamente sem perspectiva de vida produtiva. Não podem reconhecer, porque seria admitir a falência do capitalismo e a condição parasitária da burguesia e de sua burocracia estatal, da qual faz parte o aparato repressivo. Os representantes da burguesia e pequena burguesia, que resistem em se adaptar ao direitismo e fascismo burguês, se valem dos direitos humanos em abstrato, das lamentações e do pacifismo impotente. Essas duas tendências – a da mentalidade fascista e a do pacifismo – predominam em cada situação de explícita barbárie. São distintas, mas se completam por constituírem duas variantes políticas e ideológicas da mesma classe opressora. A ausência da classe operária, organizada sobre a base de um programa próprio, possibilita que ambas as tendências burguesas, cada uma com o seu método, mantenham os explorados desorientados e passivos.

Diante de uma chacina como a do Jacarezinho, os sindicatos, as centrais e os movimentos populares se encontram em estado letárgico. Durante um ano e três meses de pandemia, a política dessas direções foi a de barrar a revolta instintiva, que se gesta no interior da população atingida pelo contágio, mortes e consequências econômicas. Nem mesmo o 1º de Maio serviu para realizar protestos em todo o país. Nem as demissões em massa, nem a escalada da fome quebraram a passividade das direções burocráticas e aburguesadas.

É nessa situação desfavorável à maioria oprimida que a polícia invadiu a favela, sabendo perfeitamente que o objetivo era o massacre. Impressiona ver partidos e burocratas sindicais dizerem que é preciso reagir, como fez a população negra norte-americana, diante do assassinato de George Floyd. Disseram que não convocariam o 1º de Maio presencial, para não quebrar o isolamento social. Cinco dias depois, dizem que é preciso sair às ruas, mas em palavras. Não tenham dúvida de que, se a classe operária e os demais explorados estivessem organizados para a luta, a reação das massas diante dessa chacina seria outra. Temos assistido a uma ofensiva sem precedente contra os empregos e salários. Temos visto a fome se multiplicar nos bairros operários, favelas e cortiços. E também assistimos ao avanço da repressão policial nestes bairros, visando à caça e ao fuzilamento de jovens, arrastados ou não para a criminalidade.

O Supremo Tribunal Federal recomendou que as ações da polícia fossem comedidas na situação delicada da pandemia. A polícia bolsonarista do Rio de Janeiro fez exatamente o contrário. O Ministério Público foi avisado da “Operação Exceptis” pouco depois da invasão do Jacarezinho. Está claro que essa conduta é parte da crise política que vem afetando a federação, em razão das divergências entre os governantes sobre a pandemia. Essa demonstração de força da polícia do Rio de Janeiro ocorreu depois dos bolsonaristas ganharem as ruas no 1º de Maio, com as faixas insuflando o golpe militar.

O conjunto desses fatores expõe a traição que os explorados têm sofrido e vêm sofrendo durante a Pandemia , por suas direções sindicais e políticas. O resultado é que mais um massacre passará como uma simples eliminação de “bandidos”, como querem fazer crer o general Mourão e Bolsonaro.  É preciso que esse acontecimento sirva para alertar a classe operária e a sua vanguarda, sobre a gravidade e os perigos da passividade em que estão mergulhados os trabalhadores.

Trata-se de defender a convocação imediata de um Dia Nacional de Luta, que tenha por objetivo responder à incapacidade da burguesia e seus governantes de protegerem as massas da Pandemia; levantar o programa de emergência próprio dos explorados, e constituir um tribunal popular para apurar a chacina de Jacarezinho e toda sorte de violência policial. Esse passo poderá criar as condições para se trabalhar pela autodefesa dos explorados, diante da polícia e do narcotráfico.

Pelo fim das chacinas!

Chega de assassinato de jovens pela polícia!

Por um tribunal popular para apurar a ação da polícia no Jacarezinho!