• 09 set 2021

    Décima Sexta Carta do POR – 7 de Setembro: Manifestações pró e contra o governo Bolsonaro

Décima Sexta Carta do Partido Operário Revolucionário

Aos trabalhadores e à juventude oprimida

7 de Setembro

Manifestações pró e contra o governo Bolsonaro

Somente a classe operária pode encarnar uma saída revolucionária à profunda crise política

9 de setembro de 2021   

Bolsonaro e bolsonaristas realizaram massivas manifestações, como haviam prometido. Não se trata de minimizar a importância, mas de compreender a sua real dimensão social e política. O resultado demonstrou que o presidente da República e sua camarilha militar estão na defensiva. Nesta avaliação, reside o fundamental dos acontecimentos de 7 de setembro e da articulação precedente dos bolsonaristas.

Distintamente, as manifestações da Campanha nacional Fora Bolsonaro se mostraram aquém de sua capacidade de mobilização. Eis por que não estiveram à altura de se contrapor às gigantescas manifestações da ultradireita em São Paulo, Brasília e Rio de Janeiro. Para agravar a pequena participação dos explorados e da juventude, os atos se limitaram a discursos demagógicos e eleitoreiros, bem como às festividades de batuques. Inevitavelmente, essa comparação esteve diante dos olhos da população, em particular, da classe operária.

A debilidade numérica da manifestação do Anhangabaú consistiu em um retrocesso, se comparada com qualquer um dos quatro atos anteriores. E a debilidade política se refletiu na ausência de uma marcha, que caracterizou o movimento, desde a quebra da passividade em 29 de maio. Embora se notem diferenças entre os atos nos estados, o que se passou em São Paulo serviu de epicentro dos choques políticos, tanto para o governo como para a oposição. A decisão de não se realizar a marcha em São Paulo se deu sob a pressão do governador Doria, e da Polícia Militar.

As direções sindicais e políticas da Campanha Nacional Fora Bolsonaro mostraram o quanto mantêm os sindicatos operários sob o bloqueio e passividade. Não se dispuseram a responder aos preparativos de Bolsonaro e bolsonaristas, que, com muita antecedência, estruturaram nacionalmente as manifestações, e colocaram como carro-chefe os estados do Sul, Sudeste e Centro-Oeste. Essas direções assistiram atônitas aos aparatos, de grupos empresariais, de policiais, de igrejas evangélicas e de classe média alta, armarem uma grande arregimentação da pequena burguesia, e mesmo de camadas populares.  Não reagiram à altura da ação da ultradireita, que jogava uma cartada golpista, embora sem possibilidade de concretizar o objetivo ditatorial. Em São Paulo, onde a cartada bolsonarista seria mais alta, as direções sindicais e políticas se encolheram a tal ponto, que limitaram a manifestação do Anhangabaú à militância de base reformista, centrista e burocrática-sindical. Essa conduta leviana e irresponsável condiz com a estratégia burguesa da bandeira “Fora Bolsonaro”, cujo conteúdo real corresponde à divisão interburguesa e à disputa eleitoral.

As necessidades vitais dos explorados, golpeados pela Pandemia, demissões, redução salarial e aumento da miséria e fome, nunca estiveram na base da luta contra os governantes, os capitalistas e o Congresso Nacional, que aprovou o programa emergencial de Bolsonaro. As crises sanitária e econômica vêm sendo utilizadas apenas para discursos de palanque eleitoral. As direções burocráticas, não só fecharam as portas dos sindicatos por mais de um ano, como também isolaram e quebraram greves, como a da Renault, Ford, LG e Correios. Foram responsáveis por centenas de acordos de redução salarial e suspensão de contratos de trabalho, com o argumento de que a MP 936 permitiria a manutenção de postos de trabalho. Nesse exato momento, as direções sindicais dos metalúrgicos afundaram as campanhas salariais. Não convocaram assembleias gerais presenciais, e não se dispuseram a unificar as campanhas.

Essa política de colaboração de classes, há muito, vem mutilando a classe operária, que, cada vez mais, aumenta a sua desconfiança nas direções burocráticas, e se afasta de seus sindicatos. As inúmeras centrais provocaram uma grande divisão, cujo objetivo foi e é o de amparar partidos adaptados ao Congresso Nacional, às disputas eleitorais e às divisões oligárquicas. Uniram-se circunstancialmente, em torno à campanha do “Fora Bolsonaro”, e assim preparam o caminho deste ou daquele candidato à presidência da República, prometendo cinicamente que, com a substituição do governo Bolsonaro por outro governo, a situação irá melhorar para os desempregados, subempregados, pobres, miseráveis e famintos. Está aí por que a ruidosa manifestação dos bolsonaristas na Av. Paulista obscureceu a festiva e inconsequente manifestação do Anhangabaú. O que ocorreu em todo o país.

As correntes que se dizem revolucionárias, socialistas, comunistas, marxistas, leninistas e trotskistas, que se sujeitaram à estratégia burguesa do “Fora Bolsonaro”, armada pelo PT, PCdoB, PSOL, PDT, PSB e Solidariedade, estão obrigadas a fazer um rigoroso balanço crítico de seu seguidismo, e de sua responsabilidade em permitir que o programa de reivindicações vitais dos explorados não tenha sido o motor das mobilizações. Sem que a classe operária esteja organizada e mobilizada, não há como quebrar a espinha dorsal da ultradireita, e avançar contra as demais variantes da política burguesa.

O pronunciamento de Bolsonaro, e as bandeiras golpistas levantadas por seus partidários, tão somente confirmaram o que a ultradireita vinha praticando. Os ataques ao Supremo Tribunal Federal (STF) e a exortação à intervenção militar tomaram corpo, durante esses dois anos de bolsonarismo. A diferença está em que o conflito institucional entre poderes da República se avolumou e se radicalizou neste período de pandemia, principalmente com a decisão do STF, de dar causa aos governadores quanto ao estabelecimento das diretrizes e respostas à crise sanitária. O que limitou e neutralizou a ação do governo federal. A crise federativa ganhou tal proporção, que impulsionou as divisões interburguesas, motivadas pela queda econômica e retorno dos antigos desequilíbrios estruturais. Um bolsonarista de ocasião, como o governador de São Paulo, João Doria, passou a liderar uma frente de governadores e a contrariar as posições de Bolsonaro, qualificadas de “negacionistas” e “genocidas”.

As consequências brutais da Pandemia se encarregaram de destroçar a linha geral da governabilidade da ultradireita. A CPI da Covid foi um dos sintomas mais visíveis da decomposição das relações políticas entre o governo, Congresso Nacional e o STF. Estruturou-se com o objetivo de criar as condições para o impeachment de Bolsonaro. Trouxe à tona a corrupção no Ministério da Saúde, envolvendo militares. De outro lado, o processo que implica o governo nas campanhas de falsificações (fake news) colocou nas mãos do STF uma arma para limitar as manobras de Bolsonaro. E, finalmente, a derrota da PEC do voto impresso, na Câmara dos Deputados, expôs a incapacidade do governo e de seu núcleo militar de cortarem as asas do Judiciário, e darem uma perspectiva eleitoral de continuidade da ultradireita no poder.

As ameaças de golpe não intimidaram seus opositores institucionais, que passaram a contar com o apoio de setores do grande capital. A camarilha de generais do governo, por sua vez, não conseguiu subordinar o conjunto das Forças Armadas por detrás das maquinações golpistas, articuladas pelo ministro da Defesa, general Braga Neto, e pelo Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Augusto Heleno. Os porta-vozes da burguesia mais autorizados reconheceram que uma tentativa de golpe, nestas condições, seria uma aventura.

As manifestações bolsonaristas de 7 de setembro contrariaram a posição das organizações capitalistas mais influentes, entre elas a Febraban, que pediram a “pacificação”.  Em outras palavras, que Bolsonaro se ajustasse às decisões do Legislativo e Judiciário. A oposição de centro-direita, do PSDB ao DEM, condenaram as ofensas de Bolsonaro a ministros do STF, e prometeram caminhar no sentido do impeachment. O presidente do STF, Luiz Fux, se sentiu encorajado para defender a “democracia”. De maneira que a movimentação de Bolsonaro, neste 7 de setembro, se revelou completamente defensiva. Está ainda para se constatar o que acontecerá com o locaute dos caminhoneiros, que insistem no impeachment do ministro do STF Alexandre de Moraes e no voto impresso. Tudo indica que Bolsonaro conseguiu fazer com que o feitiço se voltasse contra o feiticeiro. O bloqueio das estradas por parte de um setor empresarial de caminhoneiros agravará ainda mais a divisão interburguesa e, portanto, a crise política.

Bolsonaro não reuniu condições necessárias para bloquear as tendências desintegradoras de seu governo, impulsionadas pela continuidade da crise econômica. A conjunção de fatores, que combinam as dificuldades de retomar o crescimento econômico, recuperar postos de trabalho, e conter a alta do custo de vida, se encarregará de descarrilar ainda mais a governabilidade.  É nessa base material que se assentam as divisões interburguesas, e a necessidade de restabelecer a estabilidade política com um novo governo. O fato de o proletariado estar contido pela política de colaboração de classes facilita a burguesia encontrar uma saída institucional.

A manifestação do dia 12 de setembro, convocada por partidos de centro-direita, indicará até que ponto os oposicionistas estarão dispostos a mobilizar as camadas da classe média, que se ressentem dos impactos da crise econômica, e que entendem que seu problema diz respeito estritamente à incompetência e ao obscurantismo de Bolsonaro. É bem provável que uma parte das direções da Campanha Fora Bolsonaro se junte à articulação dos partidos de centro-direita nesse dia. Não surpreenderá, caso se confirme a adesão, uma vez que vozes do PCdoB e do Solidariedade já haviam defendido a constituição de uma frente ampla, de todos que estivessem pelo “Fora Bolsonaro”. O êxito dos bolsonaristas e a debilidade das manifestações do “Fora Bolsonaro” facilitarão as pressões em favor da junção da esquerda reformista com a centro-direita.

Não há motivo para qualquer dúvida sobre o fato de que a estratégia da bandeira do “Fora Bolsonaro e Impeachment” é parte da divisão interburguesa, que caracteriza a natureza da crise política. É bom lembrar a discussão que ocorreu na manifestação do dia 3 de julho, quando se colocou concretamente a ampliação da frente para o ingresso do PSDB e demais partidos que jurassem oposição ao governo. Depois do dia 12 de setembro, veremos se a bandeira do impeachment será hasteada um pouco mais alta que a meio mastro. Caso a articulação do PDT e do PSDB, de realizar uma ofensiva contra Bolsonaro, se confirme, será colocada à prova a frente que se formou originalmente pela Campanha Nacional Fora Bolsonaro.

A experiência tem demonstrado que já passou da hora de as correntes que se reivindicam do socialismo, comunismo, marxismo, leninismo e trotskismo romperem com a estratégia burguesa do “Fora Bolsonaro”, e rechaçarem a farsa reformista de que a remoção de Bolsonaro, pelo impeachment ou eleições, abrirá caminho para a solução dos problemas dos explorados. Já passou da hora de romperem com a política da burocracia sindical, que vem bloqueando a mobilização dos sindicatos operários.  Já passou da hora de continuarem a aceitar a demagogia da direção colaboracionista, de que o movimento “Fora Bolsonaro” está em luta pelos empregos, salários e direitos trabalhistas; que está em luta contra as privatizações e as reformas antinacionais e antipopulares. E que está em luta pela saúde pública e auxílio emergencial aos “vulneráveis”. Não há margem a nenhum tipo de dúvida de que a frente burocrática e reformista tem como único objetivo potenciar a oposição burguesa a Bolsonaro, valendo-se do deslocamento de poderosos grupos econômicos para a oposição. Já passou da hora de parar de colaborar com a direção burocrática e política, que mantém isolada a vanguarda revolucionária, a qual luta para que as manifestações se baseiem no programa próprio dos explorados, e que a classe operária organizada e mobilizada esteja em sua direção. Já passou da hora de assumirem a bandeira de convocação de um Dia Nacioal de Luta, com paralisações e bloqueios, preparado por meio de assembleias presenciais e constituição de comitês de luta por todo o país; para assim criar as condições à greve geral.

O Partido Operário Revolucionário tem concentrado seus esforços na campanha de defesa do programa de reivindicações próprio dos explorados, que se concretiza na forma de uma Carta de Reivindicações. Está colocada a constituição de uma frente de combate por essa Carta de Reivindicações, pelo método da ação direta e pela organização independente dos explorados, diante das divisões interburguesas e das soluções capitalistas para a crise de governabilidade.