• 21 nov 2020

    Não se luta consequentemente contra o racismo, se não se luta pelo fim do capitalismo

Não se luta consequentemente contra o racismo, se não se luta pelo fim do capitalismo

Massas 624, Editorial, 22 de novembro de 2020

O racismo é uma expressão ideológica da opressão de classe sofrida pelos negros. Toda forma de discriminação social é expressão da opressão de classe. Eis por que o racismo se manifesta contra os negros trabalhadores, pobres e miseráveis. Esse odioso arcaísmo da sociedade de classes, não apenas vem sendo preservado, como agravado, nas condições de desintegração do capitalismo, em que os explorados em geral, pretos e brancos, arcam com todo o seu peso.

A política burguesa se divide entre a que coloca a necessidade de cercear a virulência das manifestações raciais e a que considera desnecessário, por não ver na discriminação e na violência contra os negros a presença do racismo. O espancamento que levou à morte do operário negro João Alberto Silveira Freitas expôs essa diferença. O governo Bolsonaro lamentou o acontecimento, mas não admitiu o motivo racial. Certamente, diante da repercussão nacional e internacional, o governo racista não poderia deixar de se lamentar, como cristão evangélico. Representantes do Congresso Nacional, do Judiciário e da grande imprensa assinalaram o assassinato de João Alberto, por dois seguranças patrimoniais do Carrefour, como consequência do racismo. Uns lamentaram e condenaram a discriminação contra o negro; outros exortaram as autoridades a levar a sério as políticas públicas de inclusão dos negros na sociedade; e ainda outros lembraram que o racismo é crime no Brasil. Por outro lado, há aqueles, como o vice-presidente Mourão, que negam a existência do racismo no Brasil.

Essas diferenças somente aparecem diante de acontecimentos bárbaros, como o assassinato de João Alberto. Passada a comoção, o racismo deixa de existir como um problema nacional. Racistas e antirracistas burgueses colocam suas diferenças abaixo do poder econômico e dos interesses particulares dos capitalistas. Está mais do que demonstrado que a discriminação do negro é um fator econômico de enorme importância para o processo de exploração do trabalho, extração da mais-valia e acumulação de capital.

As estatísticas evidenciam a discriminação praticada pelo patronato, no momento de contratar o trabalhador negro e branco, e, o negro, uma vez contratado, recebe salário menor. A pobreza e a miséria são mais vastas entre a população preta. O encarceramento e os homicídios atingem muito mais os negros, principalmente a juventude. Na composição de classe, apenas uma pequena camada de negros ascende à classe média, e a burguesia é quase que inteiramente formada de brancos. A classe operária é composta majoritariamente de negros. Somente se leva a sério o racismo, se se partir da composição e das relações de classe.

Intelectuais e representantes do movimento negro afirmam corretamente que o racismo é estrutural. O que significa, para ser consequente com a caracterização, que somente se eliminará a discriminação e a violência contra a população negra, caso se elimine a sua base estrutural. Explicam que os mais de trezentos anos de escravismo determinaram as condições raciais presentes. No entanto, se negam a reconhecer que o escravismo pré-capitalista se transformou em capitalista. A condição estrutural do racismo deita suas raízes históricas no colonialismo escravista. Tais raízes permanecem no capitalismo, uma vez que são raízes de classe, de exploração e opressão. Evidentemente, modificadas pelas transformações que levaram à formação do capitalismo no Brasil. A escravidão colonial foi substituída pela escravidão assalariada. O que constituiu o proletariado, integrado de pretos e brancos.

Há que se dizer ainda que a burguesia branca capitalista deita suas raízes nos senhores de escravos. Essas raízes permanecem vigentes, sob a forma da propriedade capitalista dos meios de produção e da exploração do trabalho, por meio da qual os negros são discriminados. Eis por que o racismo, de fato, é estrutural no Brasil.

O capitalismo tem de ser transformado em socialismo, por meio da revolução proletária, para acabar com a discriminação dos negros e com todo tipo de opressão de classe. O programa de reivindicação das massas negras se choca com os interesses da burguesia. Isso porque é parte do programa do proletariado. Trata-se das massas operárias tomarem em suas mãos a luta pelo fim da opressão racial.

É sintomático que se constituiu um movimento pequeno-burguês antirracista. O ingresso de uma camada de pretos na classe média serviu, no passado, e vem servindo, no presente, de base do movimento reformista, em que um dos problemas fundamentais é o da discriminação racial. O PT se encarregou de impulsionar a tese reformista de que é possível solucionar o racismo gradualmente, por meio de um governo democrático e popular e adoção de políticas públicas. O Estatuto da Igualdade Racial foi sua principal contribuição. Partidos centristas, como o PSOL, PSTU e outros, se agarram à questão racial, para seguir os passos do reformismo.

A farsa da igualdade jurídica se desmancha dia a dia, na marcha dos acontecimentos, em que o assassinato de João Alberto é apenas um caso entre milhares (é conhecido o dado de que, a cada 21 minutos, é assassinado um preto no Brasil). Como disse o Ministro do Supremo Tribunal, Gilmar Mendes, racismo é crime. É com esse tipo de máscara que racistas e antirracistas burgueses mantêm a ordem capitalista, que oprime os explorados em geral e, as massas negras, em particular.

Na véspera do Dia da Consciência Negra, João Alberto foi espancado e sufocado até a morte, aos olhos dos funcionários do Carrefour. A festividade eleitoreira que a esquerda reformista e centrista preparava foi atingida pelo sangue do operário negro. Seus organizadores não deixaram de cumprir seu objetivo, mas foram obrigados a transformar a passividade festiva em ação de protesto, principalmente em São Paulo, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro.  Os eleitoreiros e festeiros continuarão condenando a violência dos manifestantes, que expressaram sua revolta depredando o Carrefour. Negam-se a aprender com a violência da burguesia branca contra os explorados negros. Ainda que as manifestações foram limitadas, refletiram o ódio à burguesia representada pelo Carrefour.  É pela via da luta de classes – oposta à da colaboração de classes – que os explorados negros e brancos enterrarão o capitalismo, e com ele a opressão sobre os negros.

O POR participou do Dia da Consciência Negra, com a bandeira estratégica da revolução proletária, que acabará definitivamente com a infâmia da discriminação. Seu Manifesto e seu pronunciamento na tribuna do ato se entroncaram com o ódio que despertou em todo o país, diante do assassinato de João Alberto.