• 12 jan 2023

    O significado e a importância da tentativa de golpe

O significado e a importância da tentativa de golpe

O que está colocado para classe operária e demais explorados

Publicado e distribuído nas manifestações de 9 de janeiro de 2023

A ameaça de golpe veio se gestando antes, durante e depois das eleições presidenciais. Bolsonaro, um grupo de militares de alta patente e parlamentares de sua base aliada não admitiram transferir o poder ao Lula e à frente partidária oposicionista. A contestação às urnas eletrônicas foi um sinal de que rejeitariam o resultado eleitoral favorável ao petista. O fato de o Congresso Nacional ter se colocado contra a volta do voto impresso não alterou a disposição de Bolsonaro, seus generais e séquitos partidários de ultradireita de reagirem pela via do golpe de Estado. O problema estava em arregimentar forças na burguesia e na classe média, e contar com apoio externo de uma fração do imperialismo. O que não foi possível.

O movimento articulado por poderosos setores burgueses e institucionais em torno à bandeira de “Defesa da Democracia e do Estado de Direito” indicou às Forças Armadas que não poderiam incentivar uma aventura golpista. Nesse mesmo sentido, se pronunciaram as potências, sob a orientação dos Estados Unidos. Um conjunto de ações políticas sustentado pela fração burguesa legalista, convencida de que já não havia condições de Bolsonaro manter a governabilidade, garantiu a realização das eleições, que foram extremamente polarizadas. No entanto, a fração mais radical do bolsonarismo manteve o curso da contestação golpista. Garantiu-se o processo institucional das eleições, mas nas condições em que as reações de Bolsonaro e de seus partidários continuaram seguindo o objetivo de fomentar uma revolta na classe média, condição fundamental para o desenvolvimento das condições sociais para uma intervenção militar, sob o comando de Bolsonaro.

A ultradireita aspirava impor uma ditadura militar sob o auspício do governo bolsonarista. O golpe institucional que derrubou o governo de Dilma Rousseff contou com a movimentação decisiva da ultradireita, que se aliou aos partidos de centro-direita. O governo de transição de Temer funcionou como uma ditadura civil. As forças de centro-direita, encabeçadas pelo PSDB e MDB, sobretudo, não foram capazes de eleger seu candidato. A disputa se deu entre Bolsonaro da coligação de ultradireita e Haddad da coligação de centro-esquerda. A continuidade da crise econômica, o agravamento das condições de existência dos explorados, os dois anos de pandemia, o acirramento da guerra comercial e os realinhamentos no interior do imperialismo, produzidos pela desintegração do capitalismo mundial, e que se refletiram pesadamente na América Latina, inviabilizaram o objetivo de Bolsonaro constituir uma ditadura bonapartista. Mas, não o impediram de potenciar uma variante de nacionalismo de ultradireita, apoiada em setores capitalistas internos, em estamentos das Forças Armadas e da Polícia e nas camadas mais ricas da classe média.

As raízes desse fenômeno se encontram no fracasso do nacional-reformismo, que deu lugar ao golpe de 1964 e no longo período de ditadura militar, que ficou para trás com a fim desse ciclo e a reconstituição da democracia oligárquica, que não pôde se firmar como base para a estabilidade governamental. Nenhum governo do período pós ditadura pôde escapar às crises políticas, que golpeiam a governabilidade. A explicação está em que não há possibilidade de a burguesia nacional realizar as reformas necessárias, para desenvolver as forças produtivas e superar a miséria e a fome estruturais. Essa é uma tarefa que somente o proletariado no poder tem como cumprir. O que só é possível por meio de uma revolução social.

A ascensão do PT à Presidência, assentado na popularidade eleitoral de Lula, em 2002-2003, criou a ilusão de que poderia erguer a economia do País, pôr limites ao saque imperialista, controlar a poderosa influência do capital financeiro e, assim, resolver o problema do vasto desemprego e da miséria. Não somente fracassou, como foi destituído do comando do Estado pelo golpe de 2016, sem que pudesse recorrer a um levante dos explorados contra as forças reacionárias, que se potenciavam e que levariam, finalmente, Bolsonaro à Presidência e, assim, se reconduziriam os militares para o centro da governabilidade.

Esse processo revela o quanto a democracia oligárquica e o respectivo governo de plantão estão submetidos à égide do poder militar. E revela também a incapacidade do reformismo petista de alterar as relações ditatoriais que imperam no seio do Estado burguês semicolonial.

Lula venceu no marco de uma divisão interburguesa e de uma polarização resultantes e causadoras da profunda crise política, cujo significado principal foi o de afastar a fração militar bolsonarista do centro da governabilidade. Não por acaso, os comandantes bolsonaristas resistiram em participar da diplomação de Lula, seguindo a conduta de Bolsonaro de não reconhecer a derrota eleitoral. Essa resistência, por si só, representou uma posição golpista. Os acampamentos em frente aos quarteis têm sido protegidos pelos militares, que estão de acordo com a bandeira de golpe de Estado, mas que não se aventuraram, pelo menos por enquanto, a tomarem a frente do movimento, que teve sua mais alta expressão no bloqueio nacional promovido pelos caminhoneiros.

A dissolução dessa investida golpista, no entanto, não pôs fim à articulação nacional de empresários, militares, policiais e politiqueiros, para manterem acesa a contestação às eleições e à posse de Lula. Na diplomação de Lula pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a horda bolsonarista promoveu em Brasília uma sedição, que, visto agora, serviu de preparação para a invasão do Palácio dos Três Poderes. O governador de Brasília, as autoridades policiais e militares facilitaram aos bolsonaristas, para que tivessem liberdade de ação. Essa conduta política dos poderes governamentais serviu de sinal para que o movimento golpista concentrasse forças, vindas de vários estados, no domingo, dia 9 de janeiro, para invadir as dependências do governo federal.

Bolsonaro assistiu lá dos Estados Unidos a turba defensora da volta dos militares ao poder a fazer o quebra-quebra. O seu ex-ministro da Justiça e secretário da Segurança Pública do Distrito Federal, Anderson Torres, fez o mesmo, lá do exterior, estando de mãos dadas com seu chefe Bolsonaro. Lula decidiu pela intervenção federal nas forças de segurança, que é de responsabilidade do governador Ibaneis Rocha. Somente assim, a repressão se tornou efetiva, com as prisões em massa. Mas, o exército, somente no dia seguinte, atendeu ao pedido do Ministro do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes, de desmontar o acampamento bolsonarista em frente ao seu QG, de onde se vinha organizando a conspiração.

Embora a tentativa de golpe não tenha prosperado e se configurado como uma aventura, ficou ainda mais clara a debilidade do novo governo, que terá de lidar e conviver com conspiradores da ultradireita. A investia antidemocrática de 8 de janeiro estabelece um marco da crise política, no interior da qual Lula foi eleito por uma pequena margem de votos e sobre a qual constituiu seu governo burguês de frente ampla. Passado esse momento – tudo indica que a aventura não tem como ser retomada imediatamente, foi inclusive condenada por todas as potências imperialistas e pelos mais importantes governos da América Latina – o governo de Lula ficará ainda mais preso aos partidos oligárquicos da frente ampla e dos poderes do Estado.

As manifestações convocadas pelas centrais, sindicatos e partidos serão realizadas  quando o perigo imediato do golpe já passou. Mas não deixam de ser importantes como demonstração de resistência popular à tentativa de golpe e à potenciação da ultradireita fascistizante. Não devem, porém, servir de instrumento de apoio ao governo burguês de Lula e à frente ampla burguesa que o compõe. Não se pode confundir a luta democrática dos explorados contra a tentativa de golpe e ao avanço da ultradireita fascistizante com a defesa da democracia burguesa em geral, que serve, inclusive, de abrigo à reação mais feroz, como a que Bolsonaro montou em seu governo.

As tendências golpistas vão permanecer vivas, mesmo depois do fracasso momentâneo da aventura do dia 8 de janeiro. Somente a classe operária pode dirigir um movimento de maioria oprimida contra as posições e organizações da ultradireita, sem, por isso, deixar de lutar contra todas as variantes da política burguesa, que inclui o reformismo ou pseudo reformismo encarnado pelo PT. É fundamental, nessa luta, libertar os sindicatos das direções que os submetem e os perfilam por detrás da governabilidade burguesa, em nome da democracia e da participação popular. Vencer o golpe significa na prática se opor à derrubada, pela via totalitária, do governo eleito, mas não significa, para a política do proletariado, sustentá-lo e nem deixar de combatê-lo sob a estratégia da revolução proletária.

O Partido Operário Revolucionária (POR) se colocou claramente contra o movimento golpista dos caminhoneiros, defendendo que as centrais, sindicatos e movimentos organizassem a mobilização nacional sobre a base de um programa de reinvindicação dos explorados e no terreno da mais completa independência ideológica, política e organizativa diante do novo governo burguês de Lula. Agora, o POR volta a insistir que somente operária organizada e lutando com seu programa próprio pode quebrar a espinha dorsal da ultradireita fascistizante e do golpismo, e também constituir uma oposição revolucionária ao governo de Lula, que, sem dúvida, servirá à burguesia e não aos explorados.

Abaixo a tentativa de golpe de Estado!

Pela luta independente da classe operária por seu programa e estratégia própria de poder!