• 17 mar 2023

    Editorial: A crise mundial arrasta a América Latina

Editorial, Massas 684, 11 de março de 2023

A crise mundial arrasta a América Latina

Constituir a frente única anti-imperialista

 

Tudo indica que as tendências recessivas mundiais e os desequilíbrios inflacionários não vão ser estancados e revertidos no ano que adentra. O acirramento da guerra comercial é uma de suas manifestações mais contundentes. Em meio ao embate dos Estados Unidos com a China, prolonga-se a guerra na Ucrânia. É evidente a interdependência entre a guerra comercial e a confrontação militar que se desenvolve na Ucrânia.

A Holanda acaba de acatar as pressões do imperialismo norte-americano para aumentar a restrição ao acesso da China às máquinas que produzem chips de processadores avançados. Essa decisão pode atingir duramente a indústria chinesa de alta tecnologia, uma vez que a Holanda é um dos maiores produtores dessa linha de componentes, tanto para maquinários como para produtos de consumo. O Congresso dos Estados Unidos já havia, em 2022, aprovado o projeto de Lei dos Chips de Biden, que prevê uma gigantesca intervenção estatal no valor de US$ 52 bilhões.

Nota-se uma ampla movimentação da maior potência mundial de impor suas decisões aos países subordinados ou aliados, de forma a isolar o máximo possível a China. O que tem sido difícil alargar a abrangência devido ao fato de a indústria, comércio e capitais chineses terem se elevado à condição de concorrentes em todos os continentes. Os Estados Unidos assistem desesperadamente à penetração dos produtos chineses na América Latina e o deslocamento da antiga concorrência europeia.

Trata-se de uma significativa mudança no ordenamento mundial após a Segunda Guerra e posterior à liquidação da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS). A China restauracionista passou a se chocar com a hegemonia absoluta dos Estados Unidos. A guerra na Ucrânia e o conflito aberto em Taiwan aproximaram os dois gigantes da região Euroasiática. Viram-se obrigados a fazer frente à coligação imperialista norte-americana-europeia, que se bate por incorporar o maior número possível de ex-repúblicas soviéticas à União Europeia/OTAN e limitar a capacidade comercial e financeira de expansão da China na própria Ásia, na África e na América-Latina.

Os Estados Unidos em declínio reagem impulsionando a escalada militar no Indo-Pacífico. A OTAN já deixou de ser o seu braço armado na Europa, passando a se movimentar segundo as manifestações da crise estrutural do capitalismo em qualquer parte do mundo. As duas grandes guerras envolveram as potências capitalistas. Os sinais de perigo de uma terceira guerra, na atualidade, são dados pela coalizão montada pelos Estados Unidos, que abrange não apenas países europeus, mas também asiáticos, como Japão e Coreia do Sul. Esses sintomas, que partem do prolongamento e agravamento da guerra na Ucrânia, expressam a escalada militar, a maior depois da Guerra da Coréia.

Duas semanas após a campanha de condenação da Rússia e desresponsabilizarão dos Estados Unidos e aliados, montada na ONU, quando a guerra atingiu um ano, a reunião de ministros da Defesa da União Europeia discutiu como manter o fornecimento de armas e munições ao governo de Zelenski. A Estônia, que foi uma república soviética, agora, na condição de serviçal do imperialismo, apresentou um plano para um “fundo
voluntário” de 4 bilhões de euros. É uma pequena soma, se comparada com os bilhões de dólares destinados somente pelos Estados Unidos. A novidade está em que o dirigente do Centro de Segurança e Defesa do Conselho Alemão revelou que as dificuldades de produzir armas e munições poderiam ser solucionadas, caso se acabassem com “as restrições políticas”, o que “poderia levar os banqueiros a investir em fábricas de armas”. Os interesses econômicos criaram a guerra na Ucrânia. Esse é o principal fundamento da decomposição do capitalismo do pós Segunda Guerra e da potenciação das tendências bélicas.

Em “visita” ao Brasil, o chanceler da Alemanha, Olaf Scholz, propôs ao recém-eleito Lula que contribuísse com a causa do imperialismo enviando munições. Esse foi indício de como o maior país da América do Sul poderia se envolver na guerra. Biden-Scholz não tiveram êxito, mas conseguiram que o governo brasileiro mudasse seu voto de abstenção do governo Bolsonaro para o de condenação da Rússia na ONU. Essa mesma posição foi tomada pelo governo da Argentina, e pela maioria dos governos latino-americanos. O fato é que essa investida coordenada pelos Estados Unidos pôs de manifesto as pressões do imperialismo sobre os Estados e governos latino-americanos.

Dois fatos envolvendo o Brasil fazem parte do mesmo quadro da crise mundial, expressa na guerra da Ucrânia e na guerra comercial contra a China: o pedido dos Estados Unidos para que Lula não permitisse que um navio do Irã atracasse em portos brasileiros; e a exortação para que condenasse na Comissão de Direitos Humanos da ONU o governo de Daniel Ortega, da Nicarágua. Em ambos os casos, Lula não cedeu às pressões, mas mostrou debilidade ao não rechaçar o conteúdo imperialista das medidas. No caso do Irã, trata-se de uma tentativa de envolver o Brasil na política norte-americana e israelense de cercar econômico e militarmente o país adversário. No caso da Nicarágua, cabe somente ao povo nicaraguense lutar contra a ditadura de Ortega.

Esses sinais revelam que os Estados Unidos e sua aliança vão apertar o cerco aos Estados e governos latino-americanos, para que se alinhem às diretrizes do imperialismo. É questão de tempo para que esse alinhamento vá se configurando, uma vez não são capazes de suportar as crescentes pressões internas de setores da burguesia nacional. As respostas anti-imperialistas somente podem vir do proletariado e da maioria oprimida. As manifestações grevistas na Europa expõem o caminho da luta de classes. Os constantes enfrentamentos dos explorados nos países latino-americanos, que vêm se agravando no último período, têm posto à luz do dia o programa de reivindicações dos oprimidos. É com o programa de defesa da vida dos explorados e com a estratégia da revolução proletária que a vanguarda com consciência de classe tomará a dianteira pela organização de uma frente única anti-imperialista.

A organização da frente única anti-imperialista é o caminho e o instrumento para a classe operária reagir com seu programa e estratégia de poder às tendências destrutivas e bárbaras que emergem do sistema capitalista caduco. O Partido Operário Revolucionário (POR) chama todas as correntes que se reivindicam da luta revolucionária a se colocarem pela construção de um movimento anti-imperialista e anticapitalista!